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terça-feira, 30 de agosto de 2011

Você pode estar sendo vítima de preconceito e não saber


O fato de os soropositivos serem vítimas de preconceito e discriminação com freqüência não é novidade para ninguém. Várias pessoas são dispensadas do trabalho, abandonadas por amigos e rechaçadas por vizinhos e familiares porque se descobriram infectados pelo HIV. Entretanto, o que muitos não percebem é que existem outros tipos de discriminação mais sutis que também interferem (e muito) na vida das pessoas infectadas pelo vírus da Aids. Geralmente, essas manifestações de preconceito são justificadas por um cuidado e um zelo excessivos que, ao invés de proteger o portador, afasta-o ainda mais de um convívio social saudável. É o caso de Carlos*. Depois que teve a primeira pneumonia, sua mãe resolveu separar seus copos, talheres, roupas de cama e banho. “Ela dizia que era para me proteger de outras doenças”. Na verdade, com esta atitude, a mãe de Carlos deixou claro que achava o seu filho diferente das outras pessoas. O mesmo aconteceu com Marília. Sua família resolveu fazer uma viagem. Apesar de estar bem de saúde, Marília não pôde ir porque seus pais acharam que, como ela era soropositiva, seu organismo não agüentaria uma viagem de carro de 6 horas. “Eu estava bem. Me senti muito mal por não ter ido. Tenho certeza que nada aconteceria comigo”.

Atenção com alguns cuidados excessivos
Outro exemplo comum ocorre no ambiente de trabalho. Alguns patrões, sabendo que não podem demitir seus funcionários porque são soropositivos, acabam usando desculpas esfarrapadas para excluí-los do ambiente de trabalho. É o caso de Renato*. Corretor de imóveis, ele quase foi convencido por seu patrão de que aquela função era cansativa demais para uma pessoa soropositiva. “Não sei se ele estava querendo me discriminar. Mas eu sabia que tinha condições físicas para continuar a ser corretor. Se eu fosse para a área administrativa, iria ganhar bem menos do que ganho atualmente”. Renato conversou com o seu médico. “Ele me garantiu que eu estava bem de saúde. Então, resolvi apresentar um atestado para o meu patrão. Só assim ele parou de me aborrecer”.
Como alguns soropositivos podem ficar com a imunidade mais debilitada, existem profissões que significam um risco para a saúde. Porém, quem deve avaliar isso é o próprio funcionário junto com o seu médico e não o patrão, que, na maioria das vezes, não possui conhecimento do assunto. Soares* trabalhava em um frigorífico. O seu médico o aconselhou a mudar de função para não agravar a sua saúde. Como a empresa era muito pequena, não havia lugar para Soares em outro setor. O seu patrão o encaminhou ao auxílio doença para que ele pudesse se sustentar.
A recusa no atendimento em hospitais com o pretexto de falta de condições para atender uma pessoa soropositiva é também um tipo de preconceito velado que acontece com bastante freqüência. Quando alguém passa mal e segue para uma emergência, é comum ouvir do serviço de saúde que ele não tem recursos e não está capacitado para atender a pessoa porque ela está infectada pelo HIV e acaba encaminhando-a para outro local. Com o discurso do cuidado se camufla um preconceito. Vale lembrar que esta atitude é chamada de omissão de socorro. Todo médico e profissional de saúde deve prestar atendimento quando solicitado, esta é uma norma do Conselho Federal de Medicina.

É simples perceber este tipo de preconceito 
Quando alguém lhe impede de fazer algo que você se acha absolutamente apto a fazer, tenha cuidado. A primeira pessoa que você deve recorrer é o seu médico ou o profissional de saúde do local onde você realiza o tratamento. Ele poderá ajudá-lo a esclarecer dúvidas sobre a sua capacidade física. Esclarecidas essas dúvidas, perceba se o que lhe foi sugerido o torna diferente das demais pessoas. Nunca se esqueça que o fato de estar infectado pelo HIV não o faz diferente de ninguém. “Estamos acostumados a reconhecer a violência física, que atinge diretamente o nosso corpo. Mas atitudes de preconceito e discriminação, como as que foram relatadas nesta matéria, são formas de agressão que podem ser chamadas de violências não-visíveis. Elas podem machucar tanto quanto a violência física. Os tribunais de justiça brasileiros já reconhecem esta violência não-visível, por isso existem as indenizações por danos morais. Devemos estar atentos a esse tipo de violência. O primeiro passo é identificá-la. Ela pode estar bem escondida nas atitudes mais sutis”, esclarece a advogada Cláudia de Paula, coordenadora de projeto do Programa de Direitos Humanos do Grupo de Apoio e Prevenção à Aids (Gapa) da Bahia. SV
* Nomes fictícios
Cuidado com a testagem obrigatória Ninguém pode ser obrigado a realizar o teste anti-HIV. A testagem só pode ser realizada com o consentimento das pessoas.
Trabalhador não pode ser demitido É proibida a demissão pelo fato de o trabalhador ser soropositivo. Porém, vale lembrar que não existe nenhuma lei que garanta estabilidade no emprego para pessoas com HIV.
Direito à vida e ao tratamento médico Nenhuma pessoa pode deixar de ser atendida por um profissional de saúde. O atendimento profissional a portadores do vírus HIV é um imperativo moral da profissão médica e nenhum médico, instituição pública ou privada podem recusá-lo.
O seu exame é sigiloso O profissional de saúde não pode revelar fatos ou diagnósticos sobre o paciente a ninguém, exceto às autoridades públicas.
Acesso aos medicamentos necessários Além dos medicamentos contra a Aids, o Sistema Único de Saúde garante o acesso a todos os remédios que são necessários para o seu tratamento.

Assessoria de Patrícia Rios,
advogada do Grupo Pela Vidda Niterói (RJ)


Fonte: Revista Saber Viver

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